1. A descoberta das galáxias
Por volta do século XVIII vários astrônomos já haviam observado, entre as estrelas, a presença de corpos extensos e difusos, aos quais denominaram "nebulosas". Hoje sabemos que diferentes tipos de objetos estavam agrupados sob esse termo, a maioria pertencendo à nossa própria Galáxia: nuvens de gás iluminadas por estrelas dentro delas, cascas de gás ejetadas por estrelas em estágio final de evolução estelar, aglomerados de estrelas. Mas alguns deles - as nebulosas espirais - mostraram-se galáxias individuais, como a nossa Via Láctea.
Via Láctea
Immanuel Kant (1724-1804), o grande filósofo alemão, influenciado pelo astrônomo inglês Thomas Wright (1711-1786), foi o primeiro a propor, por volta de 1755, que as nebulosas espirais poderiam ser sistemas estelares totalmente comparáveis à nossa Galáxia. Citando Kant: "[A] analogia [das nebulosas] com o sistema estelar em que vivemos... está em perfeita concordância com o conceito de que esses objetos elípticos são simplesmente universos [ilha], em outras palavras, Vias Lácteas ...". Essa idéia ficou conhecia como a "hipótese dos universos-ilha".
No entanto, as especulações cosmológicas de Kant não foram bem aceitas na época, de forma que a natureza das nebulosas permaneceu assunto de controvérsia.
Em 1908 cerca de 15 000 nebulosas haviam sido catalogadas e descritas. Algumas das nebulosas haviam sido corretamente identificadas como aglomerados estelares, e outras como nebulosas gasosas. A maioria, porém, permanecia com natureza inexplicada. O problema maior era que a distância a elas não era conhecida, portanto não era possível saber se elas pertenciam à nossa Galáxia ou não.
As galáxias diferem bastante entre si, mas a grande maioria têm formas mais ou menos regulares quando observadas em projeção contra o céu, e se enquadram em duas classes gerais: espirais e elípticas. Algumas galáxias não têm forma definida, e são chamadas irregulares.
Um dos primeiros e mais simples esquemas de classificação de galáxias, que é usado até hoje, foi inventado por Hubble nos anos 20. O esquema de Hubble consiste de três sequências principais de classificação: elípticas, espirais e espirais barradas. Nesse esquema, as galáxias irregulares formam uma quarta classe de objetos.
2.1 Espirais (S)
As galáxias espirais, quando vistas de frente, apresentam uma clara estrutura espiral. M31 e a nossa própria Galáxia são espirais típicas. Elas possuem um núcleo, um disco, um halo, e braços espirais. As galáxias espirais apresentam diferenças entre si principalmente quanto ao tamanho do núcleo e ao grau de desenvolvimento dos braços espirais. Assim, elas são subdivididas nas categorias Sa, Sb e Sc, de acordo com o grau de desenvolvimento e enrolamento dos braços espirais (a, braços pequenos e bem enrolados, c, braços grandes e mais abertos), e com o tamanho do núcleo comparado com o do disco (a, núcleo maior, c, núcleo menor). Por exemplo, uma galáxia Sa é uma espiral com núcleo grande e braços espirais pequenos, bem enrolados, de difícil resolução.
Existem algumas galáxias que têm núcleo, disco e halo, mas não têm traços de estrutura espiral. Hubble classificou essas galáxias como S0, e elas são às vêzes chamadas lenticulares. As galáxias espirais e lenticulares juntas formam o conjunto das galáxias discoidais.
Mais ou menos metade de todas as galáxias discoidais apresentam uma estrutura em forma de barra atravessando o núcleo. Elas são chamadas barradas e, na classificação de Hubble elas são identificadas pelas iniciais SB. As galáxias barradas também se subdividem nas categoria SB0, SBa, SBb, e SBc. Nas espirais barradas, os braços normalmente partem das extremidades da barra. O fenômeno de formação da barra ainda não é bem compreendido, mas acredita-se que a barra seja a resposta do sistema a um tipo de perturbação gravitacional periódica (como uma galáxia companheira), ou simplesmente a consequência de uma assimetria na distribuição de massa no disco da galáxia. Alguns astrônomos também acreditam que a barra seja pelo menos em parte responsável pela formação da estrutura espiral, assim como por outros fenômenos evolutivos em galáxias.
Normalmente se observa, nos braços das galáxias espirais, o material interestelar. Ali também estão presentes as nebulosas gasosas, poeira, e estrelas jovens, incluindo as supergigantes luminosas. Os aglomerados estelares abertos podem ser vistos nos braços das espirais mais próximas e os aglomerados globulares no halo. A população estelar típica das galáxias espirais está formada por estrelas jovens e velhas.
As galáxias espirais têm diâmetros que variam de 20 mil anos-luz até mais de 100 mil anos-luz. Estima-se que suas massas variam de 10 bilhões a 10 trilhões de vezes a massa do Sol. Nossa Galáxia e M31 são ambas espirais grandes e massivas.
2.2 Elípticas (E)
As galáxias elípticas apresentam forma esférica ou elipsoidal, e não têm estrutura espiral. Têm pouco gás, pouca poeira, e poucas estrelas jovens. Elas se parecem ao núcleo e halo das galáxias espirais.
Hubble subdividiu as elípticas em classes de E0 a E7, de acordo com o seu grau de achatamento. Imagine-se olhando um prato circular de frente: essa é a aparência de uma galáxia E0. Agora vá inclinando o prato de forma que ele pareça cada vez mais elíptico e menos circular: esse achatamento gradativo representa a sequência de E0 a E7. Note que Hubble baseou sua classificação na aparência da galáxia, não na sua verdadeira forma. Por exemplo, uma galáxia E0 tanto pode ser uma elíptica realmente esférica quanto pode ser uma elíptica mais achatada vista de frente, já uma E7 tem que ser uma elíptica achatada vista de perfil. Porém nenhuma elíptica nunca vai aparecer tão achatada quanto uma espiral vista de perfil.
As galáxias elípticas variam muito de tamanho, desde supergigantes até anãs. As maiores elípticas têm diâmetros de milhões de anos-luz, ao passo que as menores têm somente poucos milhares de anos-luz em diâmetro. As elípticas gigantes, que têm massas de até 10 trilhões de massas solares, são raras, mas as elípticas anãs são o tipo mais comum de galáxias.
2.3 Irregulares (I)
Hubble classificou como galáxias irregulares aquelas que eram privadas de qualquer simetria circular ou rotacional, apresentando uma estrutura caótica ou irregular. Muitas irregulares parecem estar sofrendo atividade de formação estelar relativamente intensa, sua aparência sendo dominada por estrelas jovens brilhantes e nuvens de gás ionizado distribuídas irregularmente. Em contraste, observações na linha de 21 cm, que revela a distribuição do gás hidrogênio, mostra a existência de um disco de gás similar ao das galáxias espirais. As galáxias irregulares também lembram as espirais no seu conteúdo estelar, que inclui estrelas de população I e II (jovens e velhas).
Os dois exemplos mais conhecidos de galáxias irregulares são a Grande e a Pequena Nuvens de Magalhães, as galáxias vizinhas mais próximas da Via Láctea, visíveis a olho nú no Hemisfério Sul. A Grande Nuvem tem uma barra, embora não tenha braços espirais. Aparentemente ela orbita a Via Láctea. Nela está presente o complexo 30 Doradus, um dos maiores e mais luminosos agrupamentos de de gás e estrelas supergigantes conhecido em qualquer galáxia. A Supernova 1987A ocorreu perto de 30 Doradus.
A Pequena Nuvem é bastante alongada e menos massiva do que a Grande Nuvem. Aparentemente é o resultado de uma colisão com a Grande Nuvem acontecida há uns 200 milhões de anos atrás.
3. A formação e evolução das galáxias
Qual a causa de existirem diferentes tipos de galáxia? Quando os primeiros estudos sobre galáxias iniciaram, o fato de as galáxia elípticas terem estrelas em geral mais velhas do que as galáxias espirais levou os astrônomos a pensarem que as diferenças se deviam à evolução, ou seja, as galáxias quando jovens seriam espirais e mais tarde evoluiriam a elípticas.
Entretanto, se determinarmos as idades das estrelas mais velhas em sistemas espirais e em sistemas elípticos, encontramos que em ambos os tipos essas estrelas são igualmente velhas, em torno de 10 bilhões de anos. Portanto, todas as galáxias que vemos começaram a se formar mais ou menos na mesma época na história do universo, e portanto têm mais ou menos a mesma idade. A diferença é que as espirais e as irregulares deram um jeito de continuar o processo de formação estelar até a época presente.
Uma diferença importante entre elípticas e espirais é a velocidade com que ocorre a formação estelar. Parece que nas elípticas a formação estelar aconteceu de forma mais rápida no início de sua evolução, talvez porque tenham se originado de nuvens protogalácticas mais densas do que as espirais. Da mesma forma, nas regiões centrais das espirais, onde a densidade era maior, a formação estelar foi rápida, mas nos braços se procedeu mais lentamente, de forma que o gás não foi consumido todo de uma vez, e a formação estelar pode continuar.
Outro fator importante é a quantidade de momentum angular (quantidade de rotação) da nuvem de gás primordial: quanto mais momentum angular a nuvem tinha inicialmente, mais achatada será a forma final. Levando isso em conta, as elípticas teriam se formado de nuvens que tinham pouca rotação quando começaram a se contrair, ao passo que as espirais teriam se formado do colapso de nuvens com mais rotação.
4. Aglomerados de galáxias
Olhando-se fotografias do céu, nota-se facilmente que as galáxias tendem a existir em grupos. De fato, provavelmente todas as galáxias pertencem a grupos, embora muitos desses grupos sejam formados de apenas duas galáxias. Outros grupos são aglomerados ricos, com milhares de membros.
4.1 O Grupo Local
O grupo de galáxias ao qual a Via Láctea pertence chama-se Grupo Local. É um aglomerado pequeno com cerca de 30 membros, dos quais a Via Láctea e Andrômeda são os mais massivos. As Nuvens de Magalhães, galáxias satélites da nossa Galáxia, também fazem parte desse grupo. Os outros membros são, na maioria, galáxias elípticas, e algumas são bem fracas. O Grupo Local ocupa um volume de 3 milhões de anos-luz na sua dimensão maior, tendo a nossa Galáxia e Andrômeda localizadas uma em cada extremidade.
4.2 Outros aglomerados de galáxias
Outros aglomerados de galáxias variam de grupos pequenos a aglomerados compactos. O aglomerado de Fornax, relativamente próximo, apresenta um conjunto variado de tipos de galáxias, embora tenha poucos membros. O grande aglomerado de Coma cobre 20 milhões de anos-luz no espaço e contém milhares de membros. O aglomerado de Virgem, situado a uma distância de 50 milhões de anos-luz, é um dos mais espetaculares do céu. Suas quatro galáxias mais brilhantes são galáxias elípticas gigantes, embora a maior parte das galáxias membros sejam espirais. O aglomerado de Virgem é tão massivo e tão próximo que influencia gravitacionalmente o Grupo Local, fazendo com que nos movamos na sua direção.
5. Colisões entre galáxias
Galáxias em aglomerados estão relativamente próximas umas das outras, isto é, as separações entre elas não são grandes comparadas com seus tamanhos (o espaçamento entre as galáxias é da ordem de apenas cem vezes o seu tamanho). Isso significa que provavelmente essas galáxias estão em frequentes interações umas com as outras.
Nos catálogos existentes de galáxias peculiares há muitos exemplos de pares de galáxias com aparências estranhas que parecem estar interagindo uma com a outra. Podemos entender muitos desses casos em termos de efeitos de maré gravitacional. Os efeitos de marés entre pares de galáxias que casualmente passam perto uma da outra têm sido estudados por Alar e Juri Toomre. Eles assinalaram três propriedades fundamentais nas interações por maré: (1) a força de maré é proporcional ao inverso do cubo da separação entre as galáxia; (2) as forças de maré sobre um objeto tende a alongá-lo; assim, os bojos de maré se formam no lado mais próximo e no lado mais distante de cada galáxia em relação à outra; (3) as galáxias perturbadas geralmente giram antes do encontro de maré e a distribuição posterior de seu material deve portanto refletir a conservação de seu momentum angular.
Como um primeiro resultado, é de se esperar que uma interação de maré entre duas galáxias puxe matéria de uma em direção á outra. Essas "pontes" de matéria realmente se formam entre as galáxias interagentes, mas também se formam caudas de matéria que saem de cada galáxia na direção oposta á outra. Devido à rotação das galáxias, as caudas e pontes podem assumir formas esquisitas, especialmente se levarmos em conta o fato de que os movimentos orbitais das galáxias podem estar em um plano que forma um ângulo qualquer com a nossa linha de visada. Os irmãos Toomre têm conseguido calcular modelos de galáxias interagentes que simulam a aparência de diversos pares de galáxias com formas estranhas, vistas realmente no céu.
5.1 Fusão de galáxias e Canibalismo galáctico
Se as galáxias colidem com velocidade relativamente baixa, elas podem evitar a disrupção por maré. Os cálculos mostram que algumas partes das galáxias que colidem podem ser ejetadas, enquanto as massas principais se convertem em sistemas binários (ou múltiplos) com pequenas órbitas ao redor uma da outra. O sistema binário recentemente formado, encontra-se envolto em um envelope de estrelas e possivelmente matéria interestelar, e eventualmente pode se fundir formando uma única galáxia. Esse processo é especialmente provável nas colisões entre os membros mais massivos de um aglomerado de galáxias, que tendem a ter velocidades relativamente mais baixas. A fusão pode converter galáxias espirais em elípticas.
O termo fusão de galáxias é usado em referência à interação entre galáxias de tamanhos semelhantes. Quando uma galáxia muito grande interage com outra muito menor, as forças de maré da galáxia maior podem ser tão fortes a ponto de destruir a estrutura da galáxia menor e então incorporar os seus pedaços. Astrônomos chamam este processo de canibalismo galáctico.
Observações recentes mostram que galáxias elípticas gigantes, conhecidas como galáxias cD, têm propriedades peculiares, tais como: halos muito extensos (até 3 milhões de anos luz em diâmetro), núcleos múltiplos, e localização em centros de aglomerados. Essas propriedades sugerem que essas galáxias se formaram por canibalismo galáctico.
O texto acima foi baseado nos livros:
"Exploration of the Universe", D. Morrison, S. Wolff e A. Fraknoi,
Saunders College Publishing, 1995.
"Astronomy - The Evolving Universe". M. Zeilik, 1994.
"Discovering Astronomy". Robbins, Jefferys e Shawl, John Wiley & Sons, Inc.,
1995.
Introdução à Astronomia e
Astrofísica